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Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2001 Nicola Cornick. Todos os direitos reservados.

O PRETENDENTE, Nº 28 - Junho 2013

Título original: Miss Verey’s Proposal

Publicada originalmente por Harlequin Enterprises, Ltd.

Publicado em português em 2003

 

Todos os direitos, incluindo os de reprodução total ou parcial, são reservados. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Enterprises II BV.

Todas as personagens deste livro são fictícias. Qualquer semelhança com alguma pessoa, viva ou morta, é pura coincidência.

™ ® Harlequin y logotipo Harlequin são marcas registadas por Harlequin Enterprises II BV.

® e ™ São marcas registadas pela Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas que têm ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-3000-4

Editor responsável: Luis Pugni

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño

www.mtcolor.es

Prólogo

 

– Diz que sim, Jane! Oh, por favor, diz que sim.

Sophia Marchment inclinou-se, com os olhos azuis a implorar e os brincos de ouro a balançar nas orelhas.

Jane Verey mordeu o lábio, parecendo aborrecida.

– Oh, Sophie, eu gostaria muito, mas...

A verdade, porém, era que Jane Verey apreciava muito as refeições, e aquilo que a sua amiga tinha sugerido era impensável. A expressão no rosto de Sophie modificou-se.

– Mas, Jane, pensa bem, é uma coisa excitante! Se tu te fores deitar sem comer e sem olhares para trás, vais sonhar com o teu futuro marido! – Sophia bateu palmas. – Ora, para mim, isso vale mais do que qualquer refeição.

Jane pensou por um longo instante no pão fresco que vira a cozinheira assar naquele mesmo dia, na manteiga recém-batida e nas finas fatias de presunto marinadas em cerveja. A sua boca encheu-se de água. Não, era impossível.

Sophia agarrou no Livro dos Encantamentos e empurrou-o para a amiga. A encadernação estava solta e o papel, cheio de pó e quebradiço, indicava que era bastante antigo. Com relutância, Jane deu uma olhadela às palavras amarelecidas.

 

 

«... pois, se se for deitar sem se alimentar na Noite de Santa Agnes e tiver cuidado para não olhar para trás, irá conjurar os sonhos e nele vislumbrar o rosto do seu futuro marido...»

 

 

Os galhos desnudos do carvalho do lado de fora da janela de Jane bateram contra o vidro. Ela deu um pulo com o susto. Sophia inclinou-se e os cachos dourados dos cabelos rebrilhavam à luz do castiçal.

– Repara! Hoje é Dia de Santa Agnes! Oh, Jane, não me obrigues a fazer isto sozinha!

Jane podia visualizar todas as dificuldades de ordem prática. Como fechar a porta do quarto sem olhar para trás? Como interpretar um sonho se aparecesse não um homem, mas dois ou até mesmo três? Estava a ponto de confrontar Sophia com estes problemas, quando a amiga falou novamente.

– Molly, a segunda camareira, jura que é verdade, Jane! Já testou duas vezes o encantamento e, em ambas as ocasiões, sonhou com Gregory Pullman, o ferreiro, e, portanto, ela sabe que deve ser verdade!

Jane não podia ver a lógica de tudo aquilo. A última vez que vira o ferreiro, ele estava a tentar arrastar uma criada para trás do estábulo, e a rapariga não era Molly, certamente.

– Gregory já se deu conta de que se vai casar com Molly? – perguntou, com sentido prático. – Pode demorar vinte anos ou mais até que ele apreenda essa verdade, tempo durante o qual ela se tornará uma solteirona amarga! E não foi essa mesma criatura que lavou a cara com orvalho na primeira manhã de Maio, jurando que isso a tornaria linda e que depois apanhou varicela?

Sophia dispensou o comentário com um gesto de mão, muito branca.

– Oh, Jane, és tão complicada! Não vai fazer mal nenhum perderes o jantar só desta vez. – Os seus olhos azuis fixaram-se no rosto da amiga. – E tu podes sonhar com um homem deslumbrante! Oh, por favor...

O estômago de Jane roncou alto. Passar fome voluntariamente parecia uma ideia intolerável, mas Sophia estava com um ar quase desesperado.

– Oh, está bem – capitulou ela, com relutância, reflectindo que Sophia jamais ficaria a saber se ela se levantasse a meio da noite e saísse à procura de comida.

 

 

Três horas mais tarde, Sophia tinha voltado a Penistone Manor e Jane recolhera-se à cama, parecendo muito triste consigo mesma, mas lembrando-se de não olhar para trás.

– Não é natural, senhora – reclamou a cozinheira a lady Verey. – Uma rapariga de quinze anos, em fase de crescimento, não deveria recusar a comida desta maneira! Ora, que desperdício!

– Jane está a crescer em mais de um sentido! – disse Simon, o seu irmão mais velho, de forma insensível, porém com alguma verdade. – Ela pode viver sem gordura de vez em quando!

 

 

A meio da noite, Jane acordou, sofrendo com as contorções da fome. O vento lá fora uivava com força, estava escuro, e pequenas rajadas de chuva sacudiam as janelas. Desapontada, não se conseguiu lembrar de ter tido um único sonho, a despeito de ter seguido as instruções com exactidão. Mas, quem sabe, com o estômago cheio, pudesse ter mais sucesso...

Esgueirou-se para fora da cama, tremendo de frio com a camisa de noite fina de algodão. Quase mudou de ideias quando pensou no ninho de lençóis e cobertores quentes e macios que deixava para trás. A porta estalou um pouco nos gonzos quando ela a começou a abrir e o corredor surgiu, escuro, conduzindo-a ao topo das escadas. Jane nunca fora uma criança supersticiosa, mas, de repente, a velha casa de Ambergate e os seus cantos cheios de sombras pareciam desconhecidos e nada aconchegantes. Estava prestes a escancarar a porta e a tomar coragem, quando ouviu passos no patamar da escada.

Um homem acabara de passar pelo canto e vinha ao longo do corredor, em direcção a ela. Jane encolheu-se, com a respiração presa. A porta estava apenas entreaberta, mas, através da abertura estreita, podia vê-lo claramente, pois ele carregava uma vela numa das mãos. Ela sabia que nunca o vira antes na vida, pois, caso contrário, lembrar-se-ia. Ele não podia ser um criado e, por um instante, Jane ficou a imaginar se o homem era, na verdade, uma aparição conjurada por uma mente febril que tinha enfraquecido pela falta de alimento.

A primeira impressão que Jane teve foi que ele parecia muito alto sob a luz bruxuleante da vela e que estava vestido com um traje informal adequado apenas a um quarto de dormir. A sua gravata pendia solta e a camisa branca estava aberta no pescoço, revelando a coluna forte do seu pescoço. As calças agarravam-se às suas coxas musculosas e a luz da vela reflectia-se nas dobras luzidias como um espelho da sua capa. Jane reteve o fôlego, examinando-o com uma estranha fascinação. Ele era muito moreno, com os cabelos negros sedosos que pareciam reluzir à luz suave. Um tufo de madeixas caiu-lhe sobre a testa e ele empurrou-o de volta com um gesto impaciente. As suas sobrancelhas escuras juntaram-se numa carranca que fez com que a face severa ficasse ainda mais ameaçadora. Então, aqueles olhos negros voltaram-se para a porta do quarto de Jane, que se encolheu entre as sombras, convencida de que ele a vira. Por um longo instante, o homem pareceu hesitar, fixando directamente a porta, antes de desaparecer. Não se ouviu mais nada, além de um suave clique de uma porta a fechar-se, no fim do corredor.

Mais ou menos dez minutos mais tarde, Jane descobriu que já tinha condições para se mover novamente. Voltou a correr para a cama e mergulhou no refúgio dos lençóis, com todas as convulsões da fome banidas pelo medo. Demorou ainda mais tempo antes de conseguir adormecer, convencida de que vira um intruso ou um fantasma, e relutando em deixar o quarto para pedir ajuda. Finalmente, caiu num sono agitado. E sonhou com o estranho homem moreno que caminhava sorrateiro pelos corredores de Ambergate.

 

 

Quando Jane acordou, de manhã, tanto o sentido prático como o apetite tinham voltado.

– Porque é que não me contaste que tínhamos um hóspede, mamã? – perguntou, durante o pequeno-almoço, servindo-se de duas porções de ovos mexidos. – Vi um cavalheiro no corredor, a noite passada, e quase fui surpreendida de camisa de noite.

Lady Verey trocou um olhar com o marido, que limpou a garganta, mas não disse nada.

– Não temos nenhum hóspede, minha querida – informou lady Verey, dedicando à filha um doce sorriso. – Tu deves ter sonhado. É isso que dá comer queijo antes de ir dormir...

– Eu não jantei na noite passada e não sonhei! – exclamou Jane, decidida, embora soubesse que estava a lutar numa batalha perdida. O rosto da sua mãe estampava aquele sorriso gentil, porém teimoso, que significava que o assunto estava encerrado.

– Sempre com o nariz num livro – disse o seu pai, dobrando o jornal com barulho. – Mal feito. Não deviam deixar a rapariga ler. É claro como água.

Lady Verey voltou o seu sorriso doce para o marido.

– Pois é, meu querido. Vais para Penistone, hoje? Talvez Jane te possa acompanhar. Marquei-lhe um compromisso com a senhora Marchment...

Houve uma troca de olhares significativos entre marido e mulher.

– Simon já está lá fora, a cavalgar – continuou lady Verey, cheia de entusiasmo. – Vai ausentar-se por horas, imagino...

Assim, nem Jane nem o seu irmão viram o cavaleiro solitário que percorreu a alameda escorregadia umas duas horas mais tarde. E, embora os criados comentassem entre si, cuidaram de atender às ordens de lady Verey, de que ninguém deveria contar a Jane ou a Simon a respeito do visitante, sob pena de serem demitidos.

 

 

– O que é que sonhaste? – perguntou Sophia, quando o lorde Verey deixou a filha na mansão da amiga. Não esperou por uma resposta. – Eu tive um sonho extraordinário com um jovem. Ele era tão lindo, de cabelos claros e olhos azuis, e extremamente ousado. Tenho a certeza... – E bateu palmas, – de que ele deve ser o meu futuro marido!

– Eu não sonhei – afirmou Jane, convicta. – Não sonhei durante toda a noite. – Expulsou da mente a imagem do homem que tinha visto no corredor. Tinha a certeza de que estava acordada quando o vira; embora tivesse sonhado com ele mais tarde, isso naturalmente não contava.

A expressão de Sophia mudou.

– Não sonhaste? Ora, Jane, que coisa terrível! Isso deve significar que tu estás destinada a ser uma solteirona!

Jane encolheu os ombros com desdém, um maneirismo que a sua mãe deplorava.

– Estou convencida de que seria melhor, para mim, não casar – disse, com a boca cheia do bolo com doce da senhora Marchment. – Acho que não daria uma boa esposa para ninguém.

Sophia estava a ponto de expressar o seu desacordo, quando algo a impediu. Sem dúvida, Jane era a sua melhor amiga, mas também não era parecida com mais ninguém.

– Talvez possas encontrar um cavalheiro disposto a não levar em conta essas tuas estranhas ideias... – ela interrompeu-se, corando um bocadinho. – Oh, Jane, tenho a certeza de que deve haver um cavalheiro adequado a ti!

Jane não se deu ao trabalho de discutir. Ela já entendera que, se insistisse em ser diferente, apenas faria com que Sophia se sentisse desconfortável. Além disso, as próximas palavras da amiga somaram-se ao dilema que já vivia e para o qual não tinha argumento.

– Oh, Jane – disse Sophia, com tristeza, – tu tens de te casar! Tu precisas! O que mais podes fazer?