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Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2001 Muna Shehadi Sill

© 2014 Harlequin Ibérica, S.A.

O lado mais selvagem, n.º 8 - Avril 2014

Título original: The Wild Side

Publicada originalmente por Harlequin Enterprises, Ltd.

Publicado em português em 2003

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Paixão e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas em que aparece ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão Harlequin Enterprises Limited. Todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-5167-2

Editor responsável: Luis Pugni

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño

Prólogo

 

Rose assoou-se e acrescentou o lenço de papel ao monte que tinha sobre a colcha rosa e branca, olhou para o relógio e teve outro ataque de soluços. Eram nove da manhã e há meia hora que tinha começado a chorar; devia faltar pouco para aquele ataque acabar.

Por fim, tinha conseguido chegar ao ponto de poder analisar os seus ataques de choro com filosofia. Podia passar meses sem nenhum, mais tarde ou mais cedo, tinha um. Eram atribuídos ao esgotamento, talvez uma suave depressão, as hormonas... o que quer que fosse.

A princípio pensava que estava a ficar louca, mas nesta altura considerava as suas lágrimas como uma forma inofensiva e provavelmente saudável de libertar a tensão. Desde que assaltaram o seu apartamento que sofria com mais frequência de ataques de choro, aquela sensação de desconforto e de violação de privacidade permaneceu, como se o intruso ainda estivesse oculto em sua casa.

Dez minutos mais tarde, os soluços foram substituídos por suspiros trémulos e depois por soluços. Rose voltou a assoar o nariz e recolheu os lenços para os ir pôr no lixo e foi até à janela, com uma careta no rosto de cada vez que apoiava o pé que Sua Majestade Real, o príncipe Rajid da Arábia Saudita, lhe pisou na noite anterior. Um homem encantador e um péssimo bailarino.

Mas toda a gente tem um defeito qualquer e no fundo suspeitava que não existia o homem capaz de a apaixonar com tal intensidade que a fizesse esquecer todos os outros. Mesmo sendo de uma forma superficial, amava os homens com quem saía e foi a única coisa com que se deu sempre bem, como uma alcoólica ou uma fumadora; era viciada em homens.

Mas e o verdadeiro amor, aquele que penetra até à alma? Duvidava que fosse capaz de o sentir, talvez o defeito fosse dela.

Secou a última lágrima da face e afastou a cortina branca para ver se a furgoneta do outro lado da rua continuava lá. Antes do roubo e daquela terrível e ameaçadora carta, o seu vício pareceu-lhe inofensivo. Ela conseguia tudo o que queria, os homens conseguiam quase tudo o que queriam, e nesse momento havia alguém que queria mais dela do que passar um bom bocado.

Não fazia ideia de quem podia ser ou do que poderia querer. Era um ex aborrecido? Alguns homens protestaram quando ela terminou a relação, mas com a maioria a separação foi amistosa.

Talvez fosse por qualquer coisa no apartamento, ao longo dos anos recebeu muitos presentes, ou talvez alguém lhe tivesse dado uma jóia de família por engano e a mamã a quisesse recuperar.

Esperava que fosse assim simples.

A furgoneta estava parada do outro lado de Garden Street, como de costume, Ted’s TV Repair, tremeu e engoliu mais lágrimas.

Podia ser uma paranóica, mas não conseguia livrar-se da sensação de que alguém a vigiava de dentro daquele veículo, devia chamar a polícia para verificarem. Sentia-se ameaçada e claustrofóbica.

Soou o telefone, sobressaltou-se e apertou ainda mais o roupão. As pessoas de quem gostava sabiam que o sábado era o dia sem telefone, o dia em que recusava sempre convites, numa espécie de homenagem perversa aos sábados sem sair que passou no instituto. Era o dia de estar em pijama, ver maus programas na televisão, comer chocolate, escrever cartas que as enfermeiras pudessem ler à mãe... O seu dia de regressão, sem responsabilidades sociais, sem limpeza, sem maquilhagem e sem homens.

O atendedor respondeu à chamada. Clique, clique. A voz aristocrática do senador Alvin Mason soou na fita.

– Vá lá, Rose. Sei que estás aí, responde, é importante.

Rose franziu o sobrolho, a voz soava estranha... tensa, o que era pouco habitual nele. Saíram durante uns meses, há mais ou menos um ano, antes dele decidir que teria mais êxito como político se fosse casado, e lançou-se à casa da esposa ideal.

Respondeu.

– Estou aqui.

– Estás boa, Rose?

Voltou a franzir o sobrolho, porque não achava que lhe interessasse muito saber como é que ela estava, e era capaz de jurar que ouvia um camião à distância. Por ventura um dos políticos mais ilustres de Massachusetts estava a telefonar de uma cabina telefónica?

– Bom, soas de uma maneira horrível, de onde estás a li...

– Soube da invasão violenta em tua casa – teve quase de gritar por cima do ruído de outro motor, – não levaram nada.

– Não – enroscou o fio à volta do pulso. Como é que ele sabia? – Também recebi uma carta, há dias, que dizia para eu ter cuidado.

O senador das famílias honradas soltou um impropério e, durante um doce momento, Rose sentiu prazer com o instinto protector que despertava nele, mas imediatamente se riu da sua mentalidade de Cinderela.

– Era suposto que isso... – voltou a dizer um impropério.

Ela ficou absolutamente imóvel. «Meu Deus, faz parte do assunto».

– Sabes alguma coisa do assunto? – nem reconheceu a sua própria voz. Não era a da rapariga doce e sexy que toda a gente achava, mas sim dura e áspera.

O senador respirou fundo, de forma audível, inclusivamente acima do ruído do tráfego.

– Rose... – ela fechou os olhos, e o corpo começou a tremer. – Rose... – repetiu com voz serena e terrivelmente séria. – Acho que te devias ir embora por uns tempos.

1

 

Riley Anderson sentou-se em frente a Charlie Watson, capitão da Divisão de Polícia de Bóston e principal partidário dos estabelecimentos de comida gordurosa da cidade, com as mãos juntas sobre a mesa, saudou-o e ficou com as costas direitas, observando Watson com imparcialidade, sem querer mostrar interesse ou suspeita. Polícias não vão com investigares privados a cafetarias mal afamadas e de prostitutas, a menos que estejam metidos em problemas.

– A questão é... – levou à boca a última batata frita e olhou melancólico para o prato vazio. A questão é, que não recorria a ti se tivesse outra alternativa, há bastantes homens no departamento que podiam tratar disto.

Riley assentiu, sem morder o anzol, imóvel, porque mantendo-se calmo e observador conseguia que as pessoas lhe contassem aquilo que não queriam contar... se a princípio ocultassem alguma coisa.

Watson bebeu um gole de refresco e pousou o copo na mesa, de uma forma que ele considerou ser um gesto poderoso, semicerrou os olhos, que eram de um azul indefinido, no seu rosto pálido e balofo.

– Na realidade, temos uma situação em que estão envolvidas pessoas importantes, muito importantes e uma outra muito má na Esquadra, não posso arriscar...

– Capitão – Riley franziu a sobrancelha, o único sinal de impaciência que se permitiu mostrar. – Vamos ao assunto.

Watson amarrotou a embalagem do hambúrguer e deixou-a cair no prato, sem deixar de, em momento nenhum, olhar para Riley.

– Está bem, queres a história clara? Vou dar-ta, não gosto de recorrer a ti... não gosto nada, mas temos um delator na esquadra, alguém desenvolveu uma boca demasiado grande e essa bocarra põe em perigo a investigação, e não posso confiar em ninguém. Em ti confio, não gosto de ti, mas confio em ti.

Riley assentiu. Não gostava nem de Charlie Watson, nem confiava nele, mas provavelmente não era a melhor altura para lhe dizer.

– O que é o trabalho?

– Envolve o apartamento de uma mulher chamada Rose, simplesmente Rose, como Cher é só Cher – afastou umas madeixas de cabelo que se libertaram da brilhantina que usava para as prender. – Achamos que pode ter recebido mercadoria roubada, mas quase de certeza sem ela saber, e estamos ansiosos por devolver essa mercadoria aos... aos donos anteriores. Ela denunciou há pouco tempo uma entrada forçada em casa dela, sem que tenham levado nada, mas alguém sabe ou suspeita que Rose possuiu essa mercadoria. Vigiamos a casa dela, para se esse alguém der outro passo, mas não quero que nenhum detective meta lá o nariz até eu saber em quem posso confiar.

Riley apertou os dentes, pois sacar alguma informação ao capitão era como jogar às vinte e quatro perguntas e, adiantando-se-lhe, fixou os olhos em Watson.

– O que é que tenho de procurar?

– Arte – o capitão remexeu no bolso até tirar um frasco com comprimidos para a acidez, sem olhar Riley nos olhos. – Uma miniatura dum retrato antigo, com a moldura cheia de jóias e parece que vale uma fortuna, mas o que raio sei eu de arte? Aliás, é mais do que isso, queremos que sejas o novo amigo de Rose, para sabermos o que é que ela sabe.

Riley relaxou o queixo, fazendo um esforço para ter paciência.

– Quem é Rose e onde é que encaixa nisto tudo?

Watson olhou à volta, como se o casal de idade que estava num dos lados e uma mãe esgotada com quatro filhos do outro, pudessem ser agentes secretos, apoiou os cotovelos na mesa, chegou o corpo para a frente e pediu a Riley para se aproximar.

– Parece que não é mais do que um bombom que sai com alguém diferente todas as noites, conheces o género. Falámos com alguns dos tipos com quem ela saiu e todos têm uma descrição diferente dela, roupa, cabelo, cor dos olhos, até a personalidade, mas decididamente é a mesma Rose. Ela reinventa-se para o homem com quem esteja no momento, percebes? Sai com eles um tempo, eles ficam coladinhos, enchem-na de presentes e, depois, passa para o seguinte. Quando fez a denúncia da entrada no apartamento dela, meteu o meu detective no bolso em dez minutos.

Watson soltou um assobio de admiração que crispou Riley, mas o que raio havia para admirar numa mulher assim?

– Um imbecil desconsolado ofereceu-lhe o retrato para a enriquecer.

– Não! Não é provável – Watson bateu com a mão na coxa, – deve ter sido para enriquecimento físico dele.

Riley pretendeu fazer uma careta de desagrado. Precisamente o género de mulher que gostarias de levar um domingo a jantar a casa da tua mãe. O caso intrigava-o por algum motivo que ainda não conseguira descobrir, mas Watson sabia muito mais do que estava a contar.

– Quem eram os anteriores donos do retrato?

– Aí é onde te deixo de fora, Anderson – semicerrou os olhos, – é um assunto policial. Entra em casa dela e encontra o retrato, informa-me a mim dos progressos, não telefones para a esquadra, e não fales com ninguém sobre isto, porque se entre os meus homens se espalha a notícia de que estás envolvido, tenho um motim.

Riley assentiu. O caso devia ser algo mais do que amantes de arte ricos a tentarem recuperar o seu precioso retrato e queria conhecer os detalhes.

Moveu o queixo, tentando conter um sorriso.

Slate ia ficar encantado, o camarada de armas, sócio e melhor amigo de Riley, e que nesse momento se encontrava no rancho da família na costa de Maine, lamentando a morte da mãe de cancro.

Riley e Slate formaram uma competente e muito condecorada unidade de combate de marines, que ganhou o respeito dos companheiros e dos superiores por igual, Géminis. Os gémeos, desenvolveram um relacionamento em que raras vezes precisavam de falar quando estavam em missão.

Se o instinto de Riley estivesse certo, e primeiro teria de investigar um pouco para ter a certeza, o caso poderia levar Slate a regressar à civilização, depois de um longo ano a cuidar da mãe. Já tinha passado muito tempo desde a última vez que trabalharam juntos.

Riley assentiu.

– Está bem.

– Pelo teu ar, não me parece que seja uma tarefa difícil fazeres intimidade com essa tal Rose.

Ficou no restaurante o tempo suficiente para acordarem os termos da missão, depois abriu a porta e dirigiu-se à rua Cambridge, respirando profundamente o ar quente do final de Junho.

Decidiu que, à tarde, o melhor que tinha a fazer era ir verificar o edifício onde vivia Rose, arquitectar um plano, investigar, e se descobrisse algo que valesse a pena, enviaria a Slate um telegrama.

A sensação inconfundível de estar a ser seguido, fez com que hesitasse um pouco os seus passos e aguardou até chegar à fachada de azulejos do edifício, voltando-se imediatamente de costas para a parede.

Um homem, impecável, com um vulto de pistola, um agente do governo.

Afastou um pouco os pés, com uma expressão neutra, enquanto o outro se aproximava, demonstrando que o seu instinto, tinha razão muito antes do que previra. O facto de ter aparecido mal acabou a entrevista com Watson, só podia significar uma coisa, o que o homem queria tinha a ver com Rose «a devoradora de homens» e o amigo coleccionador de arte.

– Ted Barker, FBI – tirou do bolso uma carteira do governo, – e você é Riley Anderson, investigador privado, ex marine destacado nas forças de reconhecimento, uma metade da unidade Géminis.

– Sim – olhou para ele com expressão impassível, surpreendido por ver na cara do outro aquilo que parecia um vislumbre de admiração e de respeito. – O que é que posso fazer por si?

– Gostávamos de falar consigo – guardou a carteira e fez um sinal ao Lincoln Towne preto que estava do outro lado da rua. – Achamos que nos pode ajudar.

 

 

– O quê? – Penny fez uma careta incrédula. – Queres conhecer um psicopata controlador e sádico que possa arruinar-te a vida? – perguntou na altura em que estava a passar a ficha técnica do filme «Nove Semanas e Meia».

– Não, não, não – Melissa afastou os grãos de milho do colo e esticou os pés descalços para a frente, tentando acalmar a necessidade emocional de actividade física. – Gostava de sentir esse género de excitação, desse perigo, quero ser dominada pela paixão, mesmo não sendo sensato, e talvez por isso mesmo.

– Tu e toda a população do mundo desde que o homem anda de pé. Sê realista, Melissa, não são coisas que aconteçam, quando chegas ao sexo, tu e o senhor Quem For já se conhecem bem um ao outro, há sempre uma equipa, sempre um jogo de poder, ou no mínimo começas a preocupar-te se a coxa está bem posta, se o braço adormece, ou se demoras de mais a atingir o orgasmo e ele começa a ficar impaciente – subiu os óculos rectangulares no nariz. – Ser dominada pela paixão é para os filmes, acredita.

– E o que dizes de ter sexo com um homem que não conheces? Alguém com quem não faças equipa? – soltou, emocionada por admitir que reconhecia semelhante acto, inclusivamente perante a sua melhor amiga. Um demónio esfomeado invadiu há pouco a sua personalidade, tirando-lhe todo o bom senso.

– Eh? Queres arriscar-te a partilhar os lençóis com um rapaz que seja o Assassino em Série das Doentias?

– De acordo. Como sabes desejo uma relação profunda e satisfatória, como toda a gente. Um dia quero casar-me e sei que género de homem é que me pode fazer feliz, mas o casamento é como a vida durante os cinco anos em que saí com Bill. Uma cómoda intimidade, encontros previsíveis, as mesmas discussões de sempre pelos mesmos assuntos de sempre – fez um gesto. – Isso eu percebo, não espero que seja uma excitação a vida inteira, mas agora não sou casada e quero algo diferente, uma aventura superficial, estimulante e fabulosa, com alguém que saiba que não é para mim.

Penny ficou boquiaberta.

– Desde quando é que és a menina Quente?

Melissa endireitou-se e dobrou as pernas.

– Não sei, estou cansada de ser sensata, responsável e previsível, para variar gostava de ser outra pessoa.

– Quem, Mata Hari? – revirou os olhos.

– Porque não? – esticou os braços por cima da cabeça e sorriu – Depois de tantos anos com Bill e de sofrer os meses seguintes a ter-me deixado, sinto-me viva, como se tivesse estado a dormir e acabasse de acordar.

– Isso de «hoje é o primeiro dia do resto da tua vida»? – observou-a por cima da moldura dos óculos.

– Obrigada por levares a sério a minha crise dos vinte e muitos anos.

– Vá lá, querida, sabes que me interessa, o que acontece é que acho que o sexo não representa nenhuma cura para o que te oprime.

– Então, qual é?

– Amor – Penny assentiu com ênfase. – Precisas de te apaixonar.

– Oh, por favor, eu estava apaixonada por Bill e olha onde me levou.

– Sim! Bill era um hábito, não era amor, dá-te tempo, olha à tua volta, pergunta às tuas amigas, mas não a mim, porque se eu conhecesse um tipo adorável, solteiro e decente, não te deixava aproximar dele – levantou-se. – Tenho de me ir embora, amanhã tenho de estar cedo na loja do museu, porque estamos à espera de um carregamento enorme de mini estatuetas de «O Pensador» para a exposição de Rodin.

Melissa acompanhou a amiga à porta, mas ficou no corredor, ouvindo as risadas provenientes do apartamento da frente. Nessa noite, Rose devia ter levado para casa o amigo com quem saiu, nunca parava.

Mais uma vez sentiu um estranho desejo, uma combinação de luxúria e pânico, como se estivesse encarcerada num elevador com John Cusack, sem saber se devia atirar-se a ele, se abrir as portas como a Super Mulher ou se deixar que a claustrofobia a controlasse.

A porta do apartamento de Rose abriu-se. Melissa retrocedeu e, sentindo-se culpada, cedeu ao seu lado de mirone quando fechou a porta e pôs o olho no orifício da porta.

Saiu um homem de pele amarelada, de fraque, provavelmente arrebatador no passado, mas agora com um atractivo de meia-idade, trazendo uma mulher risonha atrás dele. Melissa abriu muito o olho. Nessa noite, Rose parecia ter saído de um filme dos anos quarenta, o cabelo, sem dúvida uma peruca, caía-lhe com cuidado à volta da cara em ondas escuras, resplandecendo num vestido vermelho, invulgarmente discreto e que fazia sobressair a sua pele branca, apertado na cintura, com uma saia comprida que chegava ao chão e irradiava entusiasmo juvenil.

Cada vez que mudava de homem, mudava de aspecto.

Desejou ter a habilidade de tentar uma personalidade nova, de experimentar e de brincar, por um ou dois meses, pois, sabia que se fartaria, mas dois meses de festa selvagem e ininterrupta, com uma paixão desmedida, era óptimo.

O homem abraçou Rose e encurralou-a de encontro à parede, para a beijar na boca, na cara, nas mãos e depois maltratou-a emitindo um ruído animal e, com uma expressão de aborrecimento, ouviu o protesto de falsa indignação de Rose.

– Oh, Sua Majestade.

Melissa não precisava de um aristocrata, bastava-lhe um bom macho que funcionasse toda a noite.

Deixou-se cair no sofá. A quem é que queria enganar? Um homem diferente todas as noites? Um era óptimo, um homem com quem tivesse ligação, que lhe pusesse o relógio a funcionar, com quem pudesse explorar coisas que Bill nunca lhe ensinou. Alguém que fizesse algo mais do que pôr-se em cima dela, grunhir, suar, afastar-se e, depois de murmurar uma ou duas palavras carinhosas, ficar a roncar.

Mas Bill já era história e estava na altura certa, e se Rose tinha a capacidade de se metamorfosear, ela também, porque não era por qualquer razão que era directora de publicidade do Museu de Belas Artes.

Pegou no último número de Cosmopolitan e folheou-o, prestando atenção ao estilo e à atitude dos modelos. Por onde é que começava? Se queria entrar numa de orgia, ainda que fosse apenas mentalmente, então devia certificar-se de que conseguia o estilo com que conseguisse viver. Espetou o dedo na fotografia de uma modelo elegante, com um trejeito nos lábios e uma mata de cabelo escuro. O fato preto e apertado dava-lhe um ar informal, sexy e inocente ao mesmo tempo, precisamente o que queria Melissa.

Só tinha um problema, onde é que ia encontrar esse homem? Quem estaria disposto a experiências com ela? Quem a ajudaria a descobrir a sua feminilidade, a superar todas as inibições e a levasse a sítios onde nunca...?

– Oh, sim, Sua Majestade – do corredor, a voz de Rose irrompeu com clareza na fantasia de Melissa, que sorriu.

Que mais podia pedir? A nova Melissa era um facto, tinha a vontade, os meios... e a conselheira perfeita precisamente no apartamento em frente.