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Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2011 Dolce Vita Trust. Todos os direitos reservados.

PACTO POR VINGANÇA, N.º 1091 - Outubro 2012

Título original: The Pregnancy Contract

Publicado originalmente por Harlequin Enterprises, Ltd.

Publicado em português em 2012.

 

Todos os direitos, incluindo os de reprodução total ou parcial, são reservados. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Enterprises II BV.

Todas as personagens deste livro são fictícias. Qualquer seme-lhan a com alguma pessoa, viva ou morta, é pura coincidência. ® ™. Harlequin, logotipo Harlequin e Desejo são marcas registadas por Harlequin Books S.A.

® e ™ São marcas registadas pela Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas que têm ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-1295-6

Editor responsável: Luis Pugni

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño

www.mtcolor.es

Capítulo Um

 

– O meu pai morreu?

Wade observou-a atentamente. Era mesmo boa atriz. Qualquer pessoa pensaria que tinha ficado comovida, ou mesmo triste, quando soube da notícia. Mas se fosse o caso, teria estado ao lado do pai nas suas últimas horas de vida em vez de ter passado os últimos oito anos a viajar pelo mundo.

Wade teve de fazer um esforço para controlar a dor que sentia pela morte do homem que tinha sido o seu mentor e melhor amigo. Devia poder partilhar a sua dor com a filha daquele homem, mas sabia que não devia voltar a partilhar quaisquer sentimentos com Piper Mitchell.

– Há quatro dias. Isto – Wade apontou para as pessoas que circulavam pela casa – é o seu velório.

– Não pode ter morrido. Estás a mentir! – Piper tentou levar algum ar aos pulmões.

– Por que havia de mentir sobre uma coisa destas?

Wade viu que ela finalmente acreditava nele. O seu rosto tinha ficado pálido, escondendo o tom bronzeado e saudável que iluminara as suas bochechas um minuto antes. O azul dos seus olhos, que brilhavam como safiras, desapareceu sob as pupilas dilatadas. Piper deu um passo para trás e, de forma instintiva, Wade estendeu uma mão para a segurar.

– Não me estou... a sentir muito bem... – conseguiu dizer.

Ao ver que os joelhos dela fraquejavam, Wade agarrou-a e murmurou um palavrão.

– Passa-se alguma coisa, senhor Collins? – perguntou Dexter, o mordomo.

– A senhorita Mitchell desmaiou ao saber da notícia do pai – Wade conteve-se para não dizer o que, na verdade, pensava da situação.

– Quer que chame o médico?

– Não, não deve ser necessário. Vamos ver como se sente quando recuperar os sentidos. O quarto dela está preparado?

– Um dos desejos do senhor Mitchell era que o quarto da senhorita Piper estivesse sempre pronto, senhor Collins.

– Muito bem, então vou levá-la lá para cima. Importa-se de subir as coisas dela?

– Agora mesmo.

Wade subiu a escadaria ampla com Piper ao colo. Apesar da sua altura, era leve como uma pena, e quando a deixou sobre a cama reparou que estava muito magra.

– Talvez devêssemos chamar a senhora Dexter para olhar por ela – sugeriu Wade, observando Piper, inerte.

Porquê agora? perguntou-se Wade, abanando a cabeça. Por que havia de regressar, precisamente, naquele momento? Tinha visto os extratos bancários e sabia que tinha gasto todo o dinheiro do seu fundo fiduciário naqueles últimos oito anos. Mas em quê? A julgar pelas suas calças de ganga e pela camisola velha, não tinha sido em roupa.

Um barulho na porta alertou-o para a presença da caseira e da cozinheira que herdara, assim como o mordomo, quando comprara a casa a Rex Mitchell dois anos antes.

– Ai, meu Deus, o que aconteceu à menina? – exclamou a senhora Dexter, colocando uma mão na testa de Piper. – E o seu lindo cabelo... o que é isto?

– Acho que se chamam «rastas» – disse ele, irónico.

Só Piper Mitchell seria capaz de aparecer no velório do pai com aquele aspeto de refugiada. Sempre à tentar chamar a atenção, como quando era adolescente...

Não devia ficar surpreendido por isso. No fundo, o que o surpreendida era ter chegado a pensar que ela haveria de mudar com os anos. Mas não, Piper tinha demonstrado vezes sem conta que só havia uma pessoa no mundo com a quem realmente se preocupava: ela própria. E nada nem ninguém conseguiam sobrepor-se aos seus desejos de viver como queria, nem sequer um pai moribundo.

Nem sequer o filho que estivera prestes a ter.

– Senhor Collins, os convidados... – recordou-lhe Dexter.

– Sim, obrigado Dexter. Desço já.

O velório devia ser uma celebração da vida de Rex Mitchell, o homem que lhe dera uma oportunidade na vida. Rex tinha um feitio difícil por vezes, mas tinha um bom coração e sempre acreditara que o trabalho duro seria recompensado. E adorava a sua filha, que lhe retribuíra o seu amor afastando-se dele sem olhar para trás. Sim, era verdade que tentara controlar a vida de Piper porque ela era uma menina muito teimosa que precisava de alguém que a guiasse, mas não servira de nada.

Wade voltou para o salão de baile da mansão Mitchell, que fazia parte da história de Auckland, assim como as famílias que tinham vivido entre aquelas paredes, para receber os pêsames de todos os que tinham conhecido Rex em vida. Depois, pouco a pouco, foram-se despedindo e ficou finalmente sozinho. Sozinho... com Dexter e com a mulher que estava no andar de acima.

Não tinha pressa por voltar a vê-la. Não lhe apetecia passar pelo inevitável confronto, porque sabia que o resultado ia ser muito desagradável.

Com um longo suspiro, atravessou a biblioteca e foi servir um conhaque, um ritual do qual tinham desfrutado todas as noites antes que a doença de Rex o obrigasse a ficar acamado. Deixando-se cair num cadeirão, levantou o copo para o cadeirão vazio à frente dele num brinde silencioso.

– Vejo que não demoraste muito a ir beber o conhaque do meu pai.

Wade ficou tenso ao ouvir a voz de Piper na porta, mas não ia dar-lhe a satisfação de mostrar quanto o incomodava aquela acusação. Ela, melhor do que ninguém, sabia o que pensava das pessoas que bebiam demais.

– Queres um copo? – perguntou-lhe, sem se dar ao trabalho de virar a cabeça para olhar para ela.

– Claro, porque não?

Depois de beber uns goles, sentou-se no cadeirão que o seu pai costumava ocupar. Tinha tomado banho e vestido umas calças de ganga limpas e uma camisola mais fina que destacava a sua magreza. Até o seu rosto estava mais angular e os seus olhos mais sérios. Nada a ver com a jovenzinha mimada que lhe roubara o coração uns anos antes, espezinhando-o quando se fora embora.

– Ainda não acredito que morreu...

Wade percebia. Até para ele tinha sido difícil aceitar que Rex estava doente quando lhe entregara as rédeas do negócio, dezoito meses antes. E, antes disso, quando lhe vendera a sua casa para evitar que caísse nas mãos erradas após a sua morte.

– Eu também nunca pensei que morreria tão cedo. O tratamento para o cancro de testículos até costuma ser bem sucedido.

– Cancro? Pensei que tinha morrido de um ataque cardíaco.

– Por que é que pensavas isso?

– Não sei... – Piper suspirou. – Não sabia que estava doente e pensei que devia ter sido o seu coração. Sempre trabalhou tanto...

Wade viu que os seus olhos se enchiam de lágrimas. Ele não concordara com esconder-lhe a doença do pai, nas raras ocasiões que se dignava a ligar, e nos últimos meses, a insistência de Rex sobre aquele assunto fora o motivo de discussões. Rex não achava que Piper fosse suficientemente forte para lidar com a sua doença mas, sendo a sua única filha, na opinião de Wade, devia ter estado ao lado dele nos últimos dias. Era-lhe indiferente se era suficientemente forte ou não.

– Teria voltado antes se soubesse – disse Piper.

– Talvez por isso ele não quis dizer-te nada – replicou ele, frustrado. Não quisera saber nada dele nos últimos anos, portanto também não mudaria muito querer estar ao seu lado nos últimos dias.

As lágrimas de Piper foram imediatamente substituídas por um brilho de raiva.

– O que é que queres dizer com isso?

– O que disse. O teu pai queria que voltasses, mas por decisão própria, não porque tivesses que voltar.

– O que estás a dizer é que o desiludi... mais uma vez – disse Piper.

– Eu não disse isso – Wade deixou escapar um suspiro. – O Rex queria evitar-te todos os problemas e isso também incluía a sua doença. Não queria que passasses por isso. Mas agora tudo é relativo, não é?

– Acho que não é errado pensar que sempre fui uma desilusão para ele – murmurou, antes de dar mais um gole de conhaque. – Tu, no entanto, continuas a ser um menino de ouro.

Piper teve de conter a vontade de começar a gritar, de fazer alguma coisa, de provocar Wade de alguma forma para que perdesse aquele ar frio e distante. No fim de contas, fizera aquilo tantas vezes quando vivia lá. Fora sempre assim entre eles e era capaz de aguentar uma discussão.

O que não era capaz de aguentar era a verdade irrefutável de que nunca mais voltaria a ver o seu pai, que nunca mais voltaria a ouvir a sua voz de trovão naquela casa, que era da sua família há várias gerações, que nunca mais ia poder voltar a abraçá-lo...

Nunca mais poderia fazer as pazes com ele e compensá-lo por todo o sofrimento que lhe causara quando era adolescente. Sabia que ele ficara muito magoado por ela ter saído de casa aos vinte anos, mas seria parva se não reconhecesse que também se sentia aliviado por não ter de lidar com o seu comportamento, tantas vezes vergonhoso.

Piper deixou o copo sobre a mesa e dobrou as pernas para se sentar melhor no cadeirão, colocando as mãos sobre os joelhos. Como podia ter-lhe escondido que estava doente? Ela tinha direito a saber. Da última vez que falara com ele parecia cansado... quando teria sido, há dois três meses? Ele devia ter-lhe contado.

Embora evidentemente partilhasse tudo com Wade, pensou, sentindo uma pontada de inveja. Desde que Rex contratara Wade como assistente na sua empresa de exportação, os dois homens tinham-se tornado muito próximos. Wade Collins tinha-se transformado rapidamente no filho que Rex sempre quisera ter, o filho pródigo ao nível do qual ela nunca conseguiria estar. Piper invejava a amizade entre ambos e fizera todos os possíveis para acabar com ela, fracassando miseravelmente e magoando irremediavelmente os dois únicos homens que alguma vez tinha amado.

Olhou para o homem que estava sentado à sua frente e, de repente, sentiu uma pontada de desejo. Mesmo com aquela expressão abatida e irritada, continuava a acelerar-lhe o coração. Tinha mudado desde que se fora embora, pensou. A sua expressão estava mais séria e enchia o fato muito melhor que antes. Evidentemente, o trabalho e a boa vida tinham-lhe feito bem.

Então, olhou para a sua mão esquerda... Não, não tinha a aliança, confirmou. E depois ficou irritada consigo própria por estar a preocupar-se com uma isso. Wade tinha sido bastante claro, fazendo-lhe notar que estava muito magoado e que não sentia a mínima simpatia por ela.

Mas a nova Piper estava decidida a compensar os erros do passado. Erros que incluíam a forma como tratara Wade e como deixara que o amor que sentia por ele a tornasse egoísta, caprichosa, sempre a pedir mais do que ele lhe podia oferecer. Agora arrependia-se de o ter obrigado a escolher entre o seu pai e ela.

– Lamento muito – começou a dizer. – Sei o que o meu pai significava para ti, o carinho que sentiam um pelo outro. Deve ter sido ser muito difícil...

Wade olhou para ela, surpreendido.

– Obrigado.

Tinha umas ruguinhas à volta dos seus olhos cinzentos que não estavam lá antes. Parecia cansado.

– Sofreu muito?

Wade negou com a cabeça.

– Os médicos fizeram todos os possíveis para que estivesse sempre confortável. Ficou aqui, em casa até ao fim. Instalamos uma cama de hospital na sala e teve uma enfermeira ao seu lado vinte e quatro horas por dia.

– Obrigado por teres estado sempre com ele – murmurou Piper.

– Ele teria feito o mesmo por mim – respondeu Wade. – Além disso, não queria estar em mais lado nenhum.

Lá estava outra vez: a recriminação, a subtil bofetada. O lembrete de que ela não tinha estado ao lado do seu pai... Piper tentou conter o instinto de se justificar, porque não serviria de nada. Não, não serviria de nada, mas sempre podia começar de novo.

– Agradeço-te muito tudo o que fizeste pelo meu pai. Deve ter-se sentido melhor contigo ao seu lado. Sempre te respeitou muito.

– O sentimento era mútuo.

– E agora, o que é que vai acontecer à empresa?

– Em que sentido? – perguntou-lhe Wade.

– Bom, já sabes, vai continuar tudo como dantes, agora que o meu pai já não está à frente daquilo?

– O Rex e eu já tínhamos tudo organizado. Basicamente, eu fiquei responsável pela empresa há um ano e meio.

– A sério? – exclamou Piper, surpreendida. – O meu pai passou-te as rédeas tão cedo?

– Não teve outro remédio. Os tratamentos, aqui e fora do país, deixavam-no de rastos. Mas manteve o interesse quase até ao fim, sabes como era.

E onde estava ela um ano e meio antes? Na Somália? Não. No Quénia, a dar apoio numa clínica de mulheres. Depois disso tinha estado na Ásia com uma ONG, a ajudar as vítimas de um terramoto a encontrarem os seus parentes, e depois ainda noutro país devastado... Em todo o lado exceto onde devia estar.

Estafada, tentou disfarçar um bocejo.

– Continuas cansada? – pergunto-lhe Wade.

– Quando cheguei cá a casa estava há trinta e seis horas em viagem. Estou zombie.

– Por que é que não vais para o teu quarto? Se tiveres fome, posso pedir à senhora Dexter que te suba qualquer coisa.

Piper fez uma careta. Desde quando é que Wade era o anfitrião naquela casa? Devia ser ela a oferecer-lhe hospitalidade. Mas lembrando-se da sua resolução de fazer as pazes com ele, mordeu a língua.

– Não incomodes a Dexie. Eu vou à cozinha comer qualquer coisa.

Piper levantou-se do cadeirão e ia esticar-se... mas parou ao ver que Wade estava a observá-la.

O brilho nos olhos dele provocou-lhe um contido, mas familiar, arrepio por todo o corpo.

A antiga atração continuava lá, poderosa como sempre. Será que Wade sentia a mesma coisa? perguntou-se. Mas quando voltou a olhar para ele, os seus olhos estavam novamente frios e cinzentos, como quando a recebera umas horas antes.

Magoada com aquela rejeição, Piper tentou juntar dignidade suficiente para estender-lhe a mão.

– Obrigada por tudo o que tens feito.

Wade levantou-se. O seu metro oitenta e oito eclipsou o metro e setenta e cinco de Piper enquanto lhe apertava a mão que ela lhe oferecia.

– Só o fiz pelo Rex.

– Eu sei e agradeço-te. A sério.

Wade retirou a mão como se lhe queimasse.

– Bom... – começou a dizer Piper. – Levo-te à porta. E depois acho que me vou deitar. Imagino que amanhã devo ter uma data de coisas para resolver com o notário.

Mas ele não se mexeu.

– Há mais alguma que devas dizer-me?

Wade esboçou um sorriso irónico.

– Não – respondeu. – Boa noite.

Piper viu-o sair da biblioteca, mas em vez de se dirigir à porta, virou para se dirigir às escadas.

– Onde é que vais? – perguntou-lhe.

– Para o meu quarto.

– O teu quarto?

– Eu moro aqui – disse Wade, então.

– Olha, agradeço-te mesmo muito tudo o que tens feito e imagino que deves ter ficado cá a dormir algumas vezes, mas já não é preciso. Gostava de ter um pouco de intimidade para me habituar a... esta nova situação.

– Não há problema. Podes ficar cá o tempo que quiseres.

Aquela resposta deixou-a petrificada.

– Desculpa?

– Ouviste bem, Piper. Tenho a certeza de que não és parva.

Bom, aquilo já era demais. Naquele dia tivera de lidar com a morte do seu pai e com o seu reencontro com Wade. E não pensava deixar que, além disso, ainda a insultasse.

– Acho que ambos sabemos que entre nós há passado suficiente para não ser lá muito boa ideia que fiques cá a dormir.

– Provavelmente – Wade encolheu os ombros. – Mas acho que percebeste mal, Piper. Eu sou o dono desta casa e tu és a minha hóspede.