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© Editora Gato-Bravo, 2018


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editor Marcel Lopes

coordenação editorial Paula Cajati

revisão Laura Mateus Fonseca

capa Diana Cordeiro

paginação Aron Balmas


Título original Os Libertistas

Autor Diana Brígida Correia


Impressão e Acabamento Europress Indústria Gráfica

isbn 978-989-99934-9-5

1a edição: setembro/2018

Depósito legal: 445831/18



gato.bravo

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1900-440 Lisboa, Portugal
tel. [+351] 300 509 050
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O homem não é nada mais
do que aquilo que faz a si próprio.
jean-paul sartre

Sumário

Prólogo

capítulo 1: 17 anos

capítulo 2: O convite

capítulo 3: Entrada

capítulo 4: Chave mestra

capítulo 5: Leonardo

capítulo 6: Deixado para trás

capítulo 7: Chuva

capítulo 8: Rival

capítulo 9: Carta

capítulo 10: Auditório

capítulo 11: Bala

capítulo 12: Apaixonado

capítulo 13: Libelinha

capítulo 14: Cofre

capítulo 15: Castelo

capítulo 16: Whisky

capítulo 17: Regresso

capítulo 18: Perseguidos

capítulo 19: Ouro

capítulo 20: Argumentos

Um mês depois

Prólogo

Dezembro de 1986, Porto.

Manuela Barreiro já trabalhava na maior fábrica de calçado da cidade há vinte anos. Já todos a conheciam como a «chefe do calçado português», tanto a nível nacional como internacional. Nunca pensou em fazer nada para além disso, até que a sua vida começou a ficar monótona e conheceu Wallace, um homem francês que mudaria a sua vida. Encontraram-se num dia excecionalmente quente de dezembro, num café perto da mansão de Manuela. Wallace era alto e magro, de sotaque bastante carregado. Aprendera português no ensino secundário e na faculdade, por isso conhecia apenas o básico da língua.

— Boa tarde, Manuela — disse, apertando-lhe a mão. — Trago aqui o folheto da Comunidade de que lhe falei — referiu, entregando-lhe o folheto e sentando-se.

— Parece-me uma iniciativa bastante interessante — comentou Manuela, com um sorriso formal.

— Concorda com as nossas condições, presumo.

— Sim.

— A Comunidade Libertista será a primeira a ser fundada em Portugal — explicou Wallace. — Em França já existe há seis anos e tudo corre bem. Já ouvi falar de si várias vezes e tenho a certeza de que o seu perfil é o adequado para fundar a primeira Comunidade Filosófica Portuguesa.

— Obrigada. Vou tratar do resto da papelada esta tarde — disse, guardando o folheto.

— Nós é que agradecemos o seu interesse e cooperação. Qualquer dúvida disponha.

Manuela voltou para casa, já era final de tarde. Assinou os papéis que tinha para assinar e, naquele momento, começou a nova etapa da sua vida, que duraria vinte e quatro anos.

capítulo 1: 17 anos

Era sexta-feira à noite, uma altura esperada por todos, especialmente pelo Alex que completava nesse dia dezassete anos. Teve a ideia de fazer uma festa num bar onde nunca tinha estado, para ser diferente.

Alex escolheu uma camisa branca, com botões castanho-claros que lhe davam um ar sofisticado, mas também descontraído. Os seus olhos eram cor de mel, a contrastar com o cabelo escuro, conferindo-lhe um aspeto amigável e ao mesmo tempo humilde.

Alex pegou no casaco e no telemóvel, saiu de casa e deparou-se com uma chuva torrencial repentina. Pôs o capuz e foi a correr até à paragem de autocarro, tentando não escorregar.

Chegou à paragem e o autocarro saiu quase em simultâneo, ao entrar, viu Nicole na última fila de cadeiras.

Nicole, uma das melhores amigas de Alex, usava sempre uma trança nos seus cabelos castanhos, tinha olhos esverdeados e um estilo hippie que combinava com a sua personalidade descontraída e aventureira.

— Olá! — disse Nicole, quando Alex se sentou ao pé dela, ainda cansado da corrida para chegar ao autocarro — Parabéns.

— Obrigado — disse Alex, sorrindo.

Alex e Nicole permaneceram em silêncio durante algum tempo, o que começou a ser confrangedor.

— Vai mais alguém, além do habitual, à festa? — perguntou Nicole.

— Não — acenou negativamente, encostando-se à cadeira. — Não tenho a certeza se a Matilde consegue vir, ela estava com alguma dificuldade em convencer os pais.

— É sempre assim — ri-se. — E depois acaba sempre por vir.

Alex riu-se, concordando. A chuva, que era forte, começara a abrandar e o trânsito desapareceu quando o autocarro virou para uma rua muito menos movimentada.

O autocarro parou na paragem onde Alex e Nicole saíam. Alex pôs de novo o capuz e Nicole tirou um guarda-chuva, que parecia que não havia de durar muito. Andaram em passo rápido até à porta do bar, onde já lá estavam Marta e Ricardo.

— Parabéns desde hoje de manhã! – exclamou Marta, abraçando Alex.

— Obrigado, Marta.

Ricardo também deu os parabéns a Alex e ficaram a falar sobre o jogo de futebol que tinha dado na televisão, o que fez Marta e Nicole revirarem os olhos de entediadas.

Marta era uma rapariga com cabelos longos, loiros e de olhos castanhos, e Ricardo, o seu namorado, tinha o cabelo castanho-claro, com um redemoinho na franja e os olhos eram verdes. Ricardo e Alex faziam parte da mesma equipa de futebol, Alex era o capitão, tendo ambos um bom físico. Alex e Ricardo eram bastante competitivos quando se conheceram, no futebol, mas com o passar do tempo tornaram-se grandes amigos.

— Temos jogo na semana que vem? — perguntou Ricardo.

— Sim... Não sei se estamos bem preparados. Mas ainda temos tempo para ficarmos a 100% — disse Alex, motivando Ricardo.

Matilde chegou à porta do bar, a correr. Fechou o seu guarda-chuva, dirigindo-se para o grupo.

— Está toda a gente! — disse Alex, depois de Matilde lhe ter dado um longo abraço de parabéns.

Matilde tinha o cabelo castanho-escuro, de lábios finos e face um pouco pálida e com sardas, os olhos eram castanhos.

Os cinco adolescentes entraram no bar e ficaram surpreendidos pelo ambiente. O bar (que nem era bem um bar) tinha um aspeto deteriorado e parecia que não recebia clientes desde... a Idade Média. Ok, vá, desde a década passada.

As paredes eram azul-escuras, mas os cantos apresentavam uma cor negra da humidade, e os bancos do balcão eram de uma madeira gasta. No bar estava um empregado com cerca de vinte e cinco anos (provavelmente, o filho do dono), um pequeno grupo de adultos, uns quatro ou cinco adolescentes e pouco mais. O grupo sentou-se à volta de uma mesa, surpreendentemente bem conservada, com uns bancos também de madeira gasta, disfarçados por um veludo almofadado barato.

As suas expressões, desconcertantemente semelhantes, demonstravam estranheza.

— Alex — disse Ricardo, franzindo o sobrolho. — Que sítio é este?

Marta encostou-se ao ombro de Ricardo.

— Isto é estranho, tens a certeza de que estamos no sítio certo? — perguntou Marta.

Alex olhou em volta, confuso.

— Sim, estamos no local certo, o meu irmão disse que o bar ficava nesta rua.

— Vamos sair daqui, isto está a cair de podre... — disse Ricardo, e Marta começou a rir.

— Isto é fixe, é diferente — retorquiu Alex, tentando incentivar os amigos.

— Vá, vamos ficar aqui. É um sítio alternativo, gosto! — exclamou Nicole. — Tenho uma coisa para ti, Alex.

Nicole tirou um presente embrulhado da sua mala e, entusiasmada, deu-o a Alex.

— Uau — disse Alex, e começa a rir. — É um colar.

— Não é só um colar, tem um símbolo hippie da paz.

— Obrigado, Nicole.

O empregado aproximou-se do grupo, com um ar de quem não dormia há mais de dois dias, e perguntou-lhes se desejavam alguma coisa para beber.

— Olhem — disse Marta, quando o empregado se foi embora —, eu acho que este empregado é um zombie.

Todos se começaram a rir, achando imensa piada a todo aquele cenário. A conversa fluiu rapidamente, como era habitual, e as raparigas acabaram a falar da nova série que todas estavam a ver e os rapazes do jogo de sábado.

Alex pediu mais uma rodada de cervejas, só o Ricardo o acompanhou. Para se divertirem ainda mais, Nicole sugeriu meterem conversa com o empregado, o que foi não foi fácil.

O empregado aproximou-se deles, com as cervejas de Ricardo e Alex, e este último meteu conversa com ele.

— Muito obrigado — agradeceu Alex. — É daqui?

O empregado demorou um tempo a perceber que a conversa era dirigida a ele, e ficou um pouco desorientado quando percebeu.

— Ah... Sim.

— Hum… nós não, moramos um pouco longe — disse Alex, e bebericou da sua cerveja.

O empregado acenou ligeiramente com a cabeça e disse:

— Eu sou o Gustavo, se precisarem de alguma coisa, digam.

O empregado foi-se embora e o grupo ficou surpreendido com a sua resposta.

— Uau — comentou Marta, levantando-se. — Até já.

Marta foi até à casa de banho, passou por um grupo de pessoas e pediu licença em voz alta porque ninguém reparara nela. Pelo caminho deixou cair a carteira. Um rapaz reparou no incidente, pegou na carteira, tentou captar a atenção de Marta, acenando-lhe, mas ela não olhou.

Passados uns minutos, Marta voltou da casa de banho e foi ter com o grupo. Sentou-se, e Ricardo pôs o braço à volta dela, bebendo mais um gole de cerveja.

— Então, de que estavam a falar? — perguntou Marta.

— Da figura triste que o Alex fez na aula de Inglês — respondeu Ricardo.

O rapaz que tinha ficado com a carteira de Marta aproximou-se do grupo, com um olhar um pouco inseguro.

— Acho que isto é teu — disse o rapaz a Marta, pondo a carteira na mesa.

Marta ficou a olhar para o rapaz, e quase se esqueceu de agradecer.

— Obrigada — acabou por dizer.

O rapaz foi-se embora, dirigindo-se para a porta do bar. Ficaram todos a olhar para ele, intrigados.

— Estranho... — disse Matilde, em voz baixa.

O grupo acabou por esquecer o rapaz estranho — todos, menos Marta.

Alex experimentou o colar que Nicole lhe tinha oferecido, o que provocou grandes gargalhadas a todos quando viram como ficava. Marta aproveitou a distração do grupo, aproximando-se da porta do bar, onde o «rapaz estranho» se encontrava.

Saiu do bar e impressionou-se com a noite gelada e o chão molhado refletindo as luzes da cidade. Marta apertou o casaco e aproximou-se do rapaz, que estava sozinho e ainda não tinha reparado nela. A rapariga não evidenciava qualquer receio de parecer demasiado direta ao abordá-lo.

— Quem és tu? — perguntou Marta.

O rapaz olhou para ela, sem expressão, e desviou o olhar. Tinha os olhos castanho-escuros, intensos, o cabelo da mesma cor, ondulado e curto. Teria cerca de dezoite anos.

Marta ficou à espera da resposta do rapaz, fitando-o. O rapaz olhou para ela de novo.

— Porque é que queres saber?

Porquê? — perguntou Marta, franzindo o sobrolho.

O rapaz olhou para ela, imperturbável, e acenou, parecendo pouco curioso na resposta.

— Porque me apetece.

O rapaz tirou um livro de bolso do casaco preto e começou a ler, ignorando-a. Marta inclinou-se para ele, tentando perceber que livro era aquele, mas não conseguiu. Passado algum tempo, fartou-se de ser ignorada.

— Se queres que faça figura de parva, posso ir-me embora. Só queria falar contigo, é assim tão difícil? — indagou Marta.

O rapaz fechou o livro, desta vez com uma expressão ligeiramente reveladora de alguma consideração pela pergunta.

— Talvez.

Marta ficou sem saber o que dizer e, apesar da indignação, não era capaz de sair dali.

O rapaz olhou para Marta, pensativo, queria formular uma pergunta como se fosse quase para lhe fazer uma vontade.

— Como é que te chamas? — acabou por perguntar.

Marta admirou-se com a iniciativa inesperada do rapaz e escondeu a sua admiração.

— Marta — respondeu, fazendo um esforço por permanecer neutra.

— Marta... — disse o rapaz, olhando para ela concentrado — Bom nome.

O rapaz continuou a ler e o contacto visual acabou.

— Como é que tu te chamas? – perguntou Marta.

O rapaz dobrou a borda da página do livro que estava a ler e colocou-o apressadamente no bolso.

— Tenho de ir — disse o rapaz, e foi-se embora.

— Mas...! — disse Marta, mas o rapaz já estava demasiado longe para a ouvir.

O rapaz continuou a andar e a sua silhueta foi ficando cada vez menos definida. Marta observava-o, insatisfeita. Voltou para o bar e sentou-se ao pé dos amigos.

— O que aconteceu? — perguntou Matilde, preocupada.

— Fui apanhar ar — respondeu.

No dia seguinte de manhã, Alex e Ricardo foram juntos para o treino de futebol. Entraram no campo, já equipados, e antes de terem começado a jogar o treinador chamou-os e avisou-os de que tinham um jogador novo, que já estava sentado no banco.

Alex olhou para ele, e pensou que o conhecia de algum lado.

Começaram a jogar, e o rapaz jogava bastante bem. A meio do treino, Alex reconheceu que o rapaz era o que tinha estado no bar, na outra noite.

No final do treino, foram para o balneário e o rapaz recebeu elogios pela sua prestação.

— Acho que já te vi em algum lado — disse Alex, arrumando o seu equipamento na mochila.

O rapaz olhou para ele, acenando afirmativamente.

— Sim, provavelmente — disse.

Ricardo também acabou por se lembrar onde tinha visto o rapaz, e olhou-o de soslaio, não simpatizando com ele.

Ricardo foi o primeiro a sair do balneário e Marta estava à espera dele.

— Olá — disse Marta.

— Olá — disse Ricardo, e deu-lhe um beijo nos lábios.

Ricardo olhou para a camisa rosa velho de Marta e para as suas calças brancas.

— Estás linda — disse Ricardo — És linda.

Marta abraçou-o, agradecendo.

— O Alex já saiu? — perguntou Marta.

— Ainda não — disse Ricardo. — Temos um novo jogador. Estava ontem à noite no bar.

Marta franziu o sobrolho, pensando que poderia ser o «rapaz estranho». Rapidamente percebeu que Ricardo não fez uma boa cara quando falou do rapaz, revelando que não simpatizara com ele.

— Ah, okay — disse, escondendo a sua curiosidade.

De repente, o «rapaz estranho» saiu do balneário e passou por Marta e Ricardo.

O rapaz olhou para trás, e reconheceu Marta. Também surpreendido, pensou dizer-lhe algo, mas Ricardo olhava para o rapaz com uma cara tão séria que ele continuou a andar como se nada fosse.

Marta ficou frustrada, e reparou na cara séria do namorado.

— Não gostas dele? — perguntou Marta, muito mais irritada do que parecia.

— Não — disse Ricardo.

— Porquê?

— Não vou com a cara dele — disse Ricardo.

Alex saiu do balneário e foi ter com Marta e Ricardo.

— Olá! — exclamou, animado.

— Olá, Alex — disse Marta.

— Foi um bom treino, Ricardo — disse Alex, e Ricardo acenou afirmativamente. — Eu tenho de ir agora, os meus pais dizem que têm um presente para mim.

— Uau, o que será? — perguntou Marta.

— Não faço ideia — disse Alex, entusiasmado — Até amanhã.

Tchau — disseram Marta e Ricardo.

Marta olhou discretamente para o «rapaz estranho», que estava junto ao portão do clube de futebol, à espera do autocarro. Vestia um casaco de lã castanho e umas calças pretas.

Ricardo e Marta foram até ao portão do clube, e daí, a pé, até ao centro comercial almoçar. O centro comercial não ficava muito longe, tinham de passar por uma rua estreita onde não havia nada, a não ser muros, uma zona aberta com uns bancos, que não era bem uma praça, e por uma ciclovia que começava à saída da «praça».

Alex entrou em casa e os pais já estavam à sua espera. Disseram-lhe que o presente estava na garagem e Alex ficou eufórico, suspeitando o que poderia ser.

Entrou na garagem com os pais e viu uma mota de cor preta opaca, com uma forma baixa, robusta e um estilo esculpido.

— 85 quilowatts! — exclamou o seu pai, orgulhoso, enquanto a mãe de Alex sorria, tentando não pensar no dinheiro que gastara.

— É fantástica — disse Alex, completamente fascinado. — Obrigado.

— Mereces, Alexandre — disse a sua mãe. — Pelas tuas notas!

Alex ficou a contemplar a mota e a observar o motor, as rodas e todos os seus pormenores. Decidiu estreá-la em grande, e não havia motivos para esperar, por isso leu o manual de instruções na diagonal, pois já estava farto de aprender sobre motas, e tirou a mota da garagem.

— Conduz com cuidado, não queiras já andar muito rápido — avisou a sua mãe.

— Claro, não te preocupes.

Alex lembrou-se de que Matilde tinha aula de violino nesse dia de manhã e que sairia daqui a meia hora. Com o intuito de fazer uma surpresa, Alex foi de mota até à escola de música de Matilde.

Estacionou ao pé da escola, tirou o capacete e ficou à espera da amiga.

Quando Matilde saiu, com a mochila do violino na mão, ficou surpreendida ao deparar-se com Alex em cima de uma mota.

— Oh, meu Deus! — exclamou Matilde, aproximando-se de Alex e de olho na mota. — O que é isso?

— É uma mota — disse Alex, rindo-se.

— Eu sei que é uma mota, idiota — disse, sarcástica. — Mas é tua?

— Sim, recebi-a nos anos. Estás à espera de alguém ou queres que te leve a casa?

— Sabes que moro longe...

— Exato — interrompeu Alex. — Assim andamos mais.

Matilde acabou por deixar-se convencer. Embora um pouco insegura no início, foi ganhando confiança em relação às aptidões de condução do rapaz, e aceitou andarem um pouco mais rápido, fazendo esvoaçar o seu cabelo castanho-escuro.

Alex entrou na autoestrada e Matilde disse-lhe para irem com mais calma, mais de uma vez, pois estava a entusiasmar-se.

Antes de passarem pela casa de Matilde, depois da autoestrada, decidiram parar numa hamburgueria para almoçar. A hamburgueria era moderna, e estava cheia de gente. Matilde queria provar a comida desde que abrira, mas ainda não tinha tido oportunidade.

Entraram na hamburgueria e sentaram-se numa mesa ao pé da janela, que tinha vista para... outros restaurantes e casas. Ah, e uma rotunda.

Alex pediu um hambúrguer grande com bacon e queijo, pois estava cheio de fome por causa do treino, e Matilde pediu um hambúrguer normal só com queijo.

— Obrigada — disse Matilde — Estava a precisar de boleia.

Anytime — disse Alex.

O empregado chegou e distribuiu-lhes a comida.

— Este ano está a correr-te bem, a nível de notas — comentou Matilde.

— Sim, mas os setores estão a pressionar-me cada vez mais... Dizem que por ser o melhor aluno tenho de fazer tudo de maneira perfeita.

— Não dizem isso diretamente...

— Mas dizem indiretamente — respondeu, rindo-se.

Matilde e Alex pediram sobremesa, pagaram, e saíram da hamburgueria. A casa de Matilde não ficava muito longe, podiam caminhar até lá.

Alex levou Matilde a casa de mota, ela agradeceu-lhe uma última vez, e despediram-se.

capítulo 2: O convite

Era segunda-feira e Nicole entrava na escola. Vestia uma sweatshirt amarelo-torrada e usava um colar com um símbolo da paz. O grupo andava todo na mesma escola, mas em turmas diferentes. Marta, Ricardo e Alex estavam na turma de Ciências e Tecnologias, e Nicole e Matilde na turma de Artes. Nicole entrou na sala, onde iam ter História de Arte, e viu Matilde. A sua turma tinha cerca de vinte e cinco alunos, e Artes era a única área com apenas uma turma, sendo a que tinha menos alunos. Os alunos de Artes sentiam-se muitas vezes excluídos por existirem tantos alunos das outras áreas na escola, e os de Artes serem tão poucos. Dos vinte e cinco alunos, vinte eram raparigas. E dos cinco rapazes, um deles frequentara apenas duas vezes a escola no primeiro período... Dizia-se que tinha desistido da escola e que só tinha vindo para Artes porque pensava que era só desenhar mãos e flores e passava de ano. O que não é muito normal, porque já estava no 11.º ano e, seguramente, já tinha tido tempo para perceber que não era bem assim. Os de Artes eram os alunos que faziam de tudo para decorar a escola, desde quadros, a esculturas, e até origamis. Contudo, nunca havia nenhuma atividade especial para eles. Os de Ciências estavam sempre a fazer visitas de estudo a tudo o que estava relacionado com as Ciências, e também tudo o que não estava; os de Economia já tinham ido ao Parlamento fazer uma visita de estudo; os de Humanidades tinham um dia só dedicado à História; os de Artes... basicamente eram os alunos que decoravam a escola.

— Olá — disse Nicole, sentando-se ao lado de Matilde.

— Olá! — exclamou Matilde.

O professor de História de Arte ainda não tinha chegado. Era o professor mais tranquilo, e os alunos por vezes abusavam um bocado.

Os poucos rapazes sentavam-se na parte de trás da sala, num canto. Não faziam muito, para além de chegarem quase sempre atrasados.

Quem entrou na sala um pouco depois de o professor ter chegado, para surpresa de todos, foi o rapaz que só tinha vindo duas vezes no primeiro período.

— Olha quem está ali — disse Matilde, admirada.

O rapaz chamava-se Miguel, mas forçava toda a gente que o conhecia a chamar-lhe João Micael, pois era o seu nome artístico de sonho.

João Micael tinha o cabelo castanho-escuro à altura dos ombros, os olhos castanhos-esverdeados, e um corpo musculado, especialmente os braços. Vestia calças de treino pretas, e uma camisola de alças cinzenta.

— Miguel? Está aqui? — perguntou o professor, surpreendido.

— É João Micael — disse, sentando-se ao lado de Matilde.

— Mas não tinha desistido da escola? – perguntou o professor.

— Sim, mas decidi voltar...

— Não sei se isso é possível, Mig... João Micael — disse o professor, tentando compreender o aluno.

— Tudo é possível, basta acreditar — disse João Micael, tirando os livros da sua mochila de pele a tiracolo — Acho que os professores deviam dar mais este tipo de motivação aos alunos... Só dão matéria, percebe? Matéria atrás de matéria... E esquecem-se de que incentivar os alunos com os verdadeiros lemas de vida também é essencial. Não deixem os vossos sonhos serem sonhos! Sejam vocês mesmos! Este tipo de incentivos é muito importante para fortalecer o nosso caráter.

— Pois... — disse o professor, sem saber o que dizer mais — Infelizmente, não há tempo para ensinar aos alunos frases motivadoras. Agora tenho de começar a aula.

— Claro, fique à vontade — disse João Micael, encostando-se na cadeira.

O professor escreveu o sumário no quadro e mostrou um vídeo sobre a arte barroca, ao qual quase ninguém prestou atenção.

João Micael estava entretido com o telemóvel, os outros quatro rapazes falavam e os outros estavam distraídos ou a dormir.

Quando o filme acabou, o professor desligou o projetor e olhou para os alunos.

— Na próxima aula falamos sobre o filme que vimos hoje — disse o professor. — Tenho uma última coisa para vos dizer. Para as férias da Páscoa, vai ser preciso fazeer um trabalho muito diferente. Cada um de vocês vai ter de passar uma semana inserido numa Comunidade que tenha uma cultura diferente. Pode ser hippie, por exemplo. Eu tenho aqui algumas sugestões — o professor entregou um folheto a cada aluno.

Nicole recebeu um folheto que dizia: «Comunidade Libertista» e ficou entusiasmada, a pensar no que seria. Matilde recebeu um folheto igual, e queriam as duas passar a semana nessa Comunidade.

Nicole e Matilde tinham intervalo de almoço depois de Educação Física, e dirigiram-se para fora da escola para almoçar, onde também estavam Alex, Marta e Ricardo.

Almoçavam sempre no mesmo sítio, numa mesa de madeira redonda de jardim ao pé da escola. Não gostavam de almoçar no refeitório porque era muito movimentado e a comida era quase sempre a mesma.

— Olá — disse Matilde.

— Oi — disse Alex, sorrindo para Matilde. — Viram o que aconteceu hoje de manhã?

— Não... O que é que aconteceu? – perguntou Matilde.

— Houve porrada — disse Ricardo, em voz baixa, rindo-se.

— Duas raparigas do 10.º ano começaram a puxar os cabelos uma à outra no meio do corredor. Foi lindo — contou Alex, rindo-se.

Matilde riu-se discretamente, pois queria aparentar maturidade. Marta começou a comer uma sandes de salmão fumado, como comia quase sempre, e Alex trouxe de casa um Tupperware enorme com massa e carne.

— Tu comes tanto...— disse Nicole.

Alex riu-se e começou a comer.

— Ah, já agora — disse Alex —, convidei o novo jogador da nossa equipa para sair connosco na sexta.

Marta parou de comer, alertada.

— Quem? — perguntou Matilde.

— Nós vimo-lo na minha festa, ele estava no bar — disse Alex. — Vocês vão gostar de o conhecer.

Marta pensou como seria confrangedor encontrar o rapaz que estava no bar, outra vez, e ele estar logo inserido no grupo de amigos dela. Parecia que o rapaz tinha aparecido do nada, foi mais ou menos o que aconteceu, e Marta ainda tinha muitas perguntas. Não que o conhecesse suficientemente bem para merecer ter justificações sobre alguma coisa, mas queria saber mais sobre ele, porque naquele momento ainda parecia um vulto, vindo do nada. Mas seria muito difícil saber mais sobre o rapaz com o resto do grupo à volta dela, especialmente Ricardo, e Marta teria de agir com subtileza.

Depois do intervalo de almoço, e como ninguém tinha tarde livre, voltaram para as aulas. Nicole e Matilde iriam ter Português e Alex, Marta e Ricardo, Matemática.

Marta entrou na sala de aula, mas sem a companhia de Alex e do namorado, porque eles tinham ido à casa de banho.

Sentou-se ao lado de uma rapariga chamada Andreia. Eram grandes amigas, mas só na escola, porque fora dela mal se viam. Talvez uma vez no verão e nas raras festas de aniversário, mas pouco mais. Andreia e Marta eram alunas que estavam mais ou menos ao mesmo nível, e por causa disso é que se davam tanto, ajudando-se uma à outra sempre que tinham dúvidas e também nos testes.

Marta, como aluna, aparentemente, não quebrava regras, o que era quase verdade, contudo havia uma exceção. Ela era uma mestre das cábulas em Biologia, a única disciplina em que não conseguia memorizar tudo. Trazia três ou quatro folhinhas pequenas, frente e verso, cheias de cábulas. Punha-as no estojo de uma maneira cuidadosamente calculada, e nunca era apanhada. O resultado era um 18 a Biologia e o «ódio» de Ricardo e Alex, que nunca conseguiam usar as cábulas porque estavam sentados na primeira fila, e, tendo já sido apanhados uma vez, a professora desconfiava sempre deles.

Ricardo e Alex chegaram à sala, e Ricardo passou as suas mãos molhadas pela cara de Marta.

— Estúpido...— disse Marta, rindo-se.

A professora de Matemática era conhecida por ser a mais carrancuda de todas. Se ela mandasse alguém calar-se, e se isso não acontecesse, ficava a olhar para o chão durante uma eternidade, à espera de silêncio. Uma vez, ninguém estava a fazer o que era suposto saiu da sala, mas depois voltou porque se tinha esquecido da carteira.

Ricardo virou-se para trás, e ficou de frente para Marta.

— Hoje tenho a casa livre — disse Ricardo, em voz baixa.

— E amanhã temos teste – disse Marta.

— Vá lá, Marta...— disse Ricardo, fazendo beicinho. — Estudamos depois.

— Não dá, já sabes como é — disse Marta, fazendo uma festinha na mão de Ricardo.

— Okay... — murmurou Ricardo, e voltou-se para a frente.

A professora deu uma aula de revisões para o teste e depois de Matemática, Marta, Ricardo e Alex foram para casa.

Era sexta-feira e ainda não tinha passado das nove da noite. Marta estava a pôr base na cara e um pouco de batom nos lábios, mas não demasiado, pois não gostava de se maquilhar muito. Ela e os amigos iam encontrar-se outra vez naquele bar despojado e rústico. O bar que todos menosprezavam no início, passou a ser um dos seus pontos de encontro.

Quando Marta chegou à porta do bar, ainda não estava lá ninguém, por isso ficou à espera dos amigos. Matilde chegou passado pouco tempo, e depois vieram Alex, Ricardo e Nicole. Ricardo destacava-se especialmente pelo casaco de cabedal, e Marta ficou impressionada quando viu que ele tinha cortado o cabelo, que agora estava quase rapado, o que disfarçava o remoinho que tinha na franja.

Alex avisou que o «rapaz estranho» chegaria um pouco atrasado, mas não sabia porquê. Claro, demasiado misterioso para dar uma justificação.

Marta elogiou o penteado de Ricardo e ele, de volta, deu-lhe um beijo na testa.

Entraram no bar e sentaram-se na mesma mesa de madeira, que tinha sido, pelos vistos, envernizada, e nos mesmos bancos de veludo almofadado. Pediram bebidas, e passado meia hora o «rapaz estranho» ainda não tinha chegado.

Marta começou a pensar se o rapaz afinal já não podia vir e se se esquecera de avisar Alex, ou talvez se tenha lembrado de que ela podia lá estar, por isso não veio.

A porta do bar abriu-se sem fazer muito barulho, e o «rapaz estranho» entrou calma e discretamente. Usava o mesmo casaco de lã castanho que Marta tinha visto na segunda-feira.

O rapaz passou os dedos pelo cabelo escuro ondulado, um pouco inseguro, e olhou para o grupo, mas não estabeleceu contacto visual com ninguém em específico.

Alex acenou-lhe, sorrindo confiantemente, e o rapaz aproximou-se e sentou-se ao lado dele, sem expressão.

Olhou finalmente para Marta, sorrindo apenas com os olhos, discretamente.

— Desculpa já termos pedido antes de chegares — disse Alex.

— Não há problema — respondeu o rapaz, tirando o casaco e colocando-o nas costas do banco.

Ricardo olhava para o rapaz de lado, observando-o. O empregado chegou ao pé do grupo com uma bandeja na mão, o mesmo empregado da semana anterior, desta vez com um ar mais vivo e menos cansado.

— Boa noite — disse o empregado olhando para o «rapaz estranho» — Vai desejar alguma coisa?

— Ah... — disse o rapaz, apanhado desprevenido — Não, estou bem.

O empregado acenou e foi-se embora.

— Olá, já agora, sou a Nicole.

— Eu sou a Matilde.

— Ricardo — disse Ricardo, sisudo.

Marta olhou para o «rapaz estranho», confusa. Deveria dizer-lhe o seu nome?

— Marta — revelou, constrangida.

— Eu sou o Mateus — respondeu.

Marta escondeu o sorriso com a mão. Finalmente sabia o nome dele.

O grupo falava de coisas banais, como escola, testes, as outras pessoas... Quem veio à conversa foi «João Micael», o colega de Matilde e Nicole.

— Ele já não vinha há dois meses! — exclamou Nicole, rindo-se, e ajeitando um cabelo que estava a sair da sua trança.

— E apareceu na nossa sala do nada — disse Matilde.

— Há uma rapariga na nossa turma que era louca por ele — acrescentou Nicole. — Não sei porquê... O João Micael é muito...

— Básico? — sugeriu Matilde.

— Sim, básico. Nem sei porque está em Artes, ele nem sabe desenhar um vaso. Enfim...

— Deixa-o estar — disse Matilde, rindo-se —, ele anima as aulas.

Mateus olhou de novo para Marta, desta vez sem nenhuma expressão que ela, pelo menos, conseguisse descodificar. Matilde e Nicole continuavam, divertidas, a falar das coisas engraçadas que aconteciam na turma. Marta recebeu um telefonema da mãe e saiu para atender.

A noite não estava muito fria, mas estava húmida e via-se algum nevoeiro ao longe. Estava um casal na casa dos quarenta a falar à porta do bar, mas o resto da rua estava deserta.

Marta falou com a mãe ao telemóvel e, quando desligou, viu que Mateus estava a fumar à porta do bar. Mateus olhou para ela, e o seu olhar era intenso, mesmo que não quisesse. Marta aproximou-se, percebendo que era desejo dele que falassem.

— Então o teu nome é Mateus — disse Marta, confiante.

Mateus olhou para Marta e sorriu discretamente. Acabou de fumar, atirou a beata para o chão e pisou-a.

— Sim — respondeu Mateus. — Que grande coincidência.

— Pois...— prosseguiu Marta, rindo-se. — Bem-vindo ao nosso grupo.

— Obrigado — agradeceu Mateus, acenando afirmativamente.

Mateus sorriu de novo, foi um sorriso verdadeiro que chegou aos olhos. Era um sorriso contagiante, mas, infelizmente, não sorria muito.

— E então...— proferiu Mateus, depois de um longo silêncio.

— Isto foi um silêncio confrangedor — interrompeu Marta, sorrindo.

— Não, não foi — retorquiu Mateus. — Há vários de tipo de silêncio, e nem todos são confrangedores.

Marta sorriu discretamente.

— O que estavas a fazer aqui na outra noite? — perguntou Marta.

— Ah... Queria sair para beber alguma coisa. Sozinho. — respondeu Mateus. A sua voz era pacífica e suave.

— Okay — disse Marta, não querendo tornar-se intrusiva.

Marta voltou para o bar passado algum tempo e sentou-se ao lado de Ricardo, que parecia nervoso.

— Aquele setor baixou-me a média — disse Ricardo, num tom agressivo. — Só porque não estudei para aquele teste estou lixado.

— Não amues, Ricardo — protestou Matilde.

— Já sabes como é que ele é...— frisou Nicole.

Mateus entrou no bar um pouco depois de Marta e sentou-se ao lado de Alex.

— Eu não estou a amuar... — disse Ricardo, efetivamente amuado.

Ricardo pôs o braço à volta de Marta.

— Estás fria — sussurou Ricardo, apertando-a mais para ela ficar quente.

Marta encostou-se a Ricardo, pensativa. Acabara de ter uma boa conversa com Mateus, que lhe parecia um rapaz misterioso. Não considerava certo o que estava a acontecer, e estava de consciência pesada, agora que estava nos braços de Ricardo.

Mateus viu Marta encostada a Ricardo, mas não mudou a sua expressão neutra. Marta sentia-se cada vez mais culpada.

— Atenção! — exclamou Nicole, levantando os braços. — Eu e a Matilde temos uma proposta para vos fazer.

— Nós temos um trabalho para fazer estas férias. O professor disse que tínhamos de passar uma semana numa Comunidade diferente — explicou Matilde. — Eu e a Nicole ficámos com um folheto que dizia «Comunidade Libertista», e achámos que podia ser giro ficar lá. Querem ir connosco?

— Fixe — disse Alex. — O que se faz nessa Comunidade?

— Pois, não está aqui muita informação sobre isso... — respondeu Nicole, tirando o folheto do bolso do casaco — Está aqui uma frase de... Sartre, que diz: «Estamos condenados à liberdade.»

— Liberdade... gosto — comentou Marta. — O que diz mais?

— Tem o número de telefone da Comunidade, e... mais nada — informou Nicole, encolhendo os ombros.

— Não diz mesmo mais nada? Tipo, onde é? — perguntou Marta, curiosa.

— Não, só tem aqui mais umas frases do mesmo homem, e se quisermos visitar a Comunidade ligamos para lá e eles levam-nos — disse Nicole.

— Que falta de informação — constatou Marta, indignada.

— Deve ser típico destes sítios meio alternativos — comentou Alex. — Mas isso parece interessante, e as férias começam já na próxima semana, por isso, está quase.

— Desde que haja internet, está tudo bem — disse Ricardo, passando os dedos pelo cabelo quase rapado.

— Não sei se deve haver... — adiantou Nicole, rindo-se. — Aceitam todos ir comigo e com a Matilde?

— Claro — respondeu Alex.

— Vamos! — exclamou Marta.

— Okay, pode ser — disse Ricardo.

Nicole e Matilde olharam para Mateus. O rapaz não sabia se estava incluído ou não, e quando percebeu que estava, arregalou um pouco os olhos, surpreendido. Estava indeciso em relação ao convite, mas, com os sorrisos e o entusiasmo dos seus novos amigos, acabou por aceitar.

Marta estava feliz por Mateus também ir, mas, por outro lado, tinha receio de se aproximar dele.